quarta-feira, 7 de outubro de 2009

A minha homenagem ao tio herói


No passado domingo a freguesia de Rebordões (Stº Tirso) descerrou um busto de homenagem ao herói nacional Joaquim Ferreira da Silva.

Como todos os verdadeiros heróis, foi humilde e nunca reconheceu nos seus actos a bravura dos seres únicos, talvez por isso o estado português o tenha esquecido durante tantos anos. Mesmo o ministro das medalhas (Paulo Portas) que quis dar medalhas a todos os que passaram pela guerra de África, esqueceu este homem único e quando interpelado, por escrito, recusou-se a responder mostrando a sua ignorância.

Certo é que graças à determinação de alguns militares que com ele viveram o pesadelo na Índia, fruto do abandono a que o estado novo os votou, Severiano Teixeira acabou por lhe fazer a justa homenagem no último 10 de Maio, na Póvoa de Varzim, a sua última morada terrena.
Este domingo foi a vez da freguesia que o viu nascer, pela mão do Sr Presidente da junta, um amigo de sua mãe e minha avó.

Transcrevo a baixo o texto que a junta de freguesia de Rebordões tem na sua "home page", sobre aquele que para mim será sempre e simplesmente o tio Joaquim.

No passado dia 10 de Maio teve lugar na cidade da Póvoa do Varzim, uma singela e justa homenagem a título póstumo ao Sr. Tenente Capelão Joaquim Ferreira da Silva.
Natural da Vila de Rebordões onde nasceu em 1916 foi filho primogénito de uma família que mais vocações deu à Igreja e à causa missionária, 1 bispo, 4 padres e 4 freiras, família esta que o então Papa Pio XII recebeu e abençoou em audiência reconhecendo assim esta importante dádiva à Igreja e a fé Cristã.
O Sr. Tenente Capelão ou se quisermos Sr. Padre Joaquim como carinhosamente era tratado foi destacado para a Índia, nas então colónias portuguesas de Goa, Damão e Dio, tendo sido feito prisioneiro de guerra juntamente com mil e setecentos militares ali deslocados, na sequência da invasão pelo Presidente da Índia Neru.
Colocados no campo de prisioneiros de Pondá, rodeados de arame farpado, viveram horas de angústia e incerteza, debaixo de um sol tórrido de mais de 40ºC, com a água e a alimentação racionalizadas, 3 prisioneiros desesperados tentaram a fuga, que foi imediatamente abortada.
Desta fuga resultaram os acontecimentos abaixo descritos.
Os sucessivos governos do após 25 de Abril, adiaram o reconhecimento da coragem deste grande português, mas em 2003 o Sr. Ministro da Defesa Engº Severiano Teixeira, depois de apreciar todo o processo resolveu atribuir a medalha militar de serviços distintos, grau de ouro, com palma.
E assim em de 10 de Maio último, com a presença da Sra. Secretária de Estado da Defesa, do Sr. Tenente General Cabral Costa, oficiais e dezenas de militares de todo o País prisioneiros de guerra da Índia, foi prestada homenagem, primeiro na Igreja do Sagrado Coração de Jesus (aonde ele esteve vários anos à frente daquela comunidade e onde acabaria por falecer) com a celebração de uma missa pelo seu irmão D. Luís, Bispo de Lichinga – Moçambique, e depois no cemitério da Póvoa do Varzim onde o Sr. Tenente General Cabral Costa, colega de presídio e capitão na altura dos acontecimentos, enalteceu os seus actos bem como as sua qualidades, homem despido de bens materiais mas de uma riqueza moral, humana e cristã imensa, foram colocadas coroas de flores no jazigo, nomeadamente do Estado Português, Associação de Prisioneiros de Guerra, Comunidade local e da Junta de Freguesia de Rebordões que assim se associou a esta, algo tardia mas muito justa homenagem.
Aqui fica a transcrição do sucedido:

“Os acontecimentos reportam-se a 1962 e ao campo de concentração de Pondá, onde estiveram presos durante largos meses cerca de 1750 militares e civis, na sequência da invasão de Goa, Damão e Diu pela União Indiana. O episódio em causa foi presenciado pela quase totalidade dos prisioneiros e viria a ser relatado por um dos oficiais que ali esteve detido. Foi no livro ‘A Queda da Índia Portuguesa. Crónica da Invasão e do Cativeiro’ (Estampa), que o coronel Carlos Alexandre de Morais descreveu o sucedido no dia 19 de Março de 1962, e que poderia ter redundado num massacre.Tudo começou com uma tentativa de fuga por parte de três prisioneiros, que procuraram evadir-se no meio do lixo transportado pela camioneta que todos os dias fazia a limpeza do campo. Quando a viatura se preparava para transpor a porta de armas, um furriel - que Carlos de Morais não nomeia -, denunciou a tentativa de fuga ao comando indiano. Dois dos três fugitivos foram imediatamente detidos, mas o terceiro escapuliu, misturando-se com “a multidão de prisioneiros que acorreu ao local”. Ao mesmo tempo, o delator, identificado pelos restantes prisioneiros, teve que ser retirado do campo pelos militares indianos, para evitar um provável linchamento. Um major indiano avisou então que, caso se repetisse uma tentativa de evasão, não hesitaria em fuzilar os seus autores - o que mereceu um protesto de um dos oficiais portugueses mais graduados, invocando a Convenção de Genebra.O caso parecia sanado, até à chegada do brigadeiro Sagat Singh, comandante-geral dos Campos de Prisioneiros de Goa. Mandou formar os prisioneiros, enquanto montava em seu redor todo um aparato bélico: metralhadoras, bazucas, morteiros. E, em frente da porta de armas, um ameaçador pelotão armado. Foi ainda a quente que o padre Ferreira da Silva descreveu os acontecimentos de que foi o principal protagonista, num artigo publicado na revista ‘Magnificat’, em 1962. Conta o jesuíta (à época, tenente capelão de Pondá) que o brigadeiro “mandou formar os soldados e perguntou se alguém queria castigar o delator. Ao contrário do que esperava, os rapazes responderam em coro: “Todos!” O homem ia indo aos arames. Mandou perguntar se tinham entendido bem. E a resposta foi igual: “Todos!” Manda então preparar o pelotão de fuzilamento e carregar as metralhadoras. Perante o risco iminente de uma carnificina, o ex-missionário saiu da formatura e dirigiu-se ao brigadeiro. “Pedi licença para falar e perguntei-lhe se, como capelão, desejava que dissesse alguma coisa aos homens. Mas a resposta foi seca: “Não! É demasiado tarde! É preciso dar uma lição a todos”. Insisti, pedindo que desse aos homens uma oportunidade. Negou novamente, perguntando se tínhamos sido alguma vez maltratados. Respondi que não, mas que já tínhamos sofrido bastante para merecermos que nos fosse dada uma oportunidade. Disse outro não muito seco e, voltando-se para trás, mandou avançar o pelotão de fuzilamento. Lancei então o último pedido desesperado, convencido da sua inutilidade: ‘Senhor, dê-nos uma oportunidade. É a primeira. Nunca teve razão séria de queixa. Por favor, dê-nos uma oportunidade’. ‘Está bem’ - respondeu - ‘mas diga-lhes que será a última’”. O brigadeiro indiano exigiu então um pedido de desculpas. O sacerdote dirigiu-se aos presos: “Rapazes, o sr. brigadeiro quer ouvir uma palavra de desculpa. Depois de a pedirem em coro, o brigadeiro deu-se por satisfeito. Agradeci, saudei e afastei-me. A tempestade terminara”.”
José Pedro Castanheira

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