domingo, 21 de março de 2010

Pela dignidade nas escolas

A propósito do suicídio do professor de música de Sintra, publico artigo recebido por concordar com a ideia base, apesar de uma referência ao pequeno Leandro que, ao que parece, a verdade é bem diferente da versão inicialmente apresentada pelos media.


Não importa a morte... o ‘prof’ até era louco!
autor

Ricardo Miguel Vasconcelos


"Segundo os jornais 'Público' e 'i', o professor de Música que se suicidou
a 9 de Fevereiro deste ano, parou o carro na Ponte 25 de Abril, em Lisboa,
e atirou-se ao rio Tejo. No seu computador pessoal, noticiam os dois
diários, deixou um texto que afirmava: 'Se o meu destino é sofrer, dando
aulas a alunos que não me respeitam e me põem fora de mim, não tendo outras
fontes de rendimento, a única solução apaziguadora será o suicídio', disse
o licenciado em Sociologia.

O 'i' coloca o 9B no centro deste caso, escrevendo que os problemas do
malogrado professor tinham como foco insultos dentro da sala de aula,
situações essas que motivaram sete participações à direcção da escola, que
em nada resultaram.

E à boa maneira portuguesa, lá veio o director regional de Educação de
Lisboa desejar que o inquérito instaurado na escola de Fitares esclareça
este caso. Mas também à boa maneira deste país, adiantou que o docente
tinha uma 'fragilidade psicológica há muito tempo'.

Só entendo estas afirmações num país que, constantemente, quer enveredar
pelo caminho mais fácil, desculpando os culpados e deixar a defesa para
aqueles que, infelizmente, já não se podem defender.
É assim tão lógico pensarmos que este senhor professor, por ter a tal
fragilidade psicológica, não precisaria de algo mais do que um simples
ignorar dos sete processos instaurados àquela turma e que em nada deram?
Pois é. O ‘prof’ era maluco, não era? Por isso, está tudo explicado.

A Direcção Regional de Educação de Lisboa (DREL), à boa maneira
portuguesa, colocou psicólogos na tal turma com medo que haja um sentimento
de culpa. E não deveria haver? Não há aqui ninguém responsável pela morte
deste professor? Pois é, era maluco, não era?

José Joaquim Leitão afirmou que os meninos e meninas desta turma devem ser
objecto de preocupação para que não haja traumas no futuro. 'Temos de nos
esforçar para que estas situações possam ser ultrapassadas. Trata-se de
jovens que são na sua generalidade bons alunos e que não podem transportar
na sua vida uma situação de culpa que os pode vir a condicionar pela
negativa', afirmou.

Toca a tomar conta dos meninos e meninas porque não pode haver um
sentimento de culpa. É verdade! O ‘prof’ era louco, não era?
Não estou a dizer que haja aqui uma clara relação causa-efeito. Mas alguma
coisa deve haver. Existem documentos para analisar, pessoas a interrogar,
algumas responsabilidades a apurar. Por isso, neste 'timing', a reacção da
DREL é desequilibrada. Só quem não trabalha numa escola ou não lida com o
ambiente escolar pode achar estranho (colocando de lado a questão do
suicídio em si) que um professor não ande bem da cabeça pelos problemas
vividos dentro da sala de aula em tantas escolas deste país.

Não se pode bater nos meninos, não é? Os castigos resultantes dos
processos disciplinares instaurados aos infractores resultam sempre numa
medida pedagógica, não é? Os papás têm sempre múltiplas oportunidades para
defenderem os meninos que não se portaram tão bem, não é? É normal um aluno
bater no professor, não é? É normal insultar um auxiliar, não é? É normal
pegar fogo à sala de aula ou pontapear os cacifos, não é? É normal levar
uma navalha para o recreio, não é? É também normal roubar dois ou três
telemóveis no balneário, não é? E também é normal os professores andarem
com a cabeça num 'oito' por não se sentirem protegidos por uma ideia
pedagógica de que os alunos são o centro de tudo, têm quase sempre razão,
que a vida familiar deles justifica tudo, inclusive atitudes violentas
sobre os colegas a que agora os entendidos dão o nome de 'bullying'?

De que valem as obras nas escolas, os 'Magalhães', a educação sexual, a
internet gratuita ou os apelos de regresso à escola, uma espécie de
parábola do 'Filho Pródigo' do Evangelho de São Lucas (cap.15), se as
questões disciplinares continuam a ser geridas de forma arcaica, com estilo
progressista, passando impunes os infractores?

Só quem anda longe do meio escolar é que ficou surpreendido com o suicídio
do pequeno Leandro ou com o voo picado para o Tejo do professor de Música.
Nas escolas, antigamente, preveniam-se as causas. Hoje, lamentam-se, com
lágrimas de crocodilo, os efeitos. O professor era louco, não era? Tinha
uma clara fragilidade psicológica, não tinha? Pobre senhor. Se calhar teve
o azar de ter que ganhar a vida a dar aulas e não conheceu a sorte daqueles
que a ganham a ditar leis do alto da sua poltrona que, em nada, se adequam
à realidade das escolas de hoje."

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